quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Brasileiros narram experiência de jogar Pokémon com outros 100 mil jogadores

Twitch Plays Pokémon (TPP) é um canal de streaming aberto onde os visitantes podem jogar uma versão online do game Pokémon Red, através de uma caixa de chat com textos. Todos mexem ao mesmo tempo no jogo. O link foi ao ar no dia 12 de fevereiro, quarta-feira, por volta das 22h. A ideia virou bagunça ou não? O fato é que o game conseguiu reunir cerca de 100 mil jogadores e visitantes simultaneamente, além de alcançar cerca de 30 milhões de pageviews. A transmissão continua online até a publicação deste texto. Para comentar o jogo via streaming, a coluna Geração Gamer conversou com sete brasileiros que passaram pela experiência de Twitch Plays Pokémon e nos contaram detalhes.
Twitch Plays Pokemon: Uma experiência coletiva que envolveu brasileiros (Foto: Reprodução)Twitch Plays Pokemon: Uma experiência coletiva que envolveu brasileiros (Foto: Reprodução)
É Anarquia ou Democracia? Um resumo do jogo
Twitch Plays Pokémon funciona como um chat tipo mIRC, carregado com comandos que influem no herói do jogo. Para participar, basta logar no Twitch e utilizar as seguintes palavras: a (para clicar no botão a do Game Boy), b (para clicar no outro botão), up (para subir com o personagem ou com o comando), down (para descer com o personagem ou com o comando), left (ir à esquerda), right (ir à direita), start (para pressionar start) e select (para pressionar select).
Os jogadores começaram com um Charmander. O nome dos bichos foi alterado para letras sem sentido algum. Em praticamente oito dias de game, só quatro insígnias foram conquistadas, nos ginásios de Brock (tipo pedra), Misty (tipo água), Lt. Surge (tipo elétrico) e Erika (tipo grama).
O excesso de comandos transformou Pokémon em uma anarquia (Foto: Reprodução/‏@taraofforest/Twitter)O excesso de comandos transformou Pokémon em uma anarquia (Foto: Reprodução/‏ Twitter)
O fato é que Twitch Plays Pokémon em pouco tempo se transformou em uma completa a Anarquia. Pokémons foram jogados fora, frequentemente o personagem ficava andando contra as paredes do game e monstrinhos completamente inesperados se tornaram poderosos companheiros na jornada.
Charmeleon, a evolução de Charmander, foi colocado para fora do jogo, descartado. Um Pidgeot tornou-se o Pokémon de nível mais alto. Os jogadores, na zoeira, começaram a louvar o item Helix Fóssil, que deu origem ao Pokémon Omanyte, como se ele fosse um deus. Ao invés de evoluir o Eevee para suas versões elétrica (Jolteon) ou aquática (Vaporeon), que são mais fortes, os jogadores transformaram ele na versão de fogo Flareon, menos querida por muitos dos que estão participando do game.
O jogo Twitch Plays Pokemon acabou dividido em dois times, com a passagem do tempo (Foto: Reprodução/Reddit)O jogo Twitch Plays Pokemon acabou dividido em dois times, com a passagem do tempo (Foto: Reprodução/Reddit)
A Anarquia dos comandos criou uma segunda facção entre os jogadores conhecida como Democracia. O criador de Twitch Plays Pokémon, que ainda é anônimo, resolveu dividir o gameplay em duas táticas. Os defensores da Anarquia continuam digitando os comandos sem ordem. Quem quer Democracia, pode optar por acionar um comando tomado por consenso nos últimos 20 segundos, para não complicar o jogo dos colegas e para terminar logo a jornada.
Ao que tudo indica, o time da Anarquia continua levando o melhor. A Democracia elegeu Flareon como seu símbolo principal, enquanto a Anarquia tem o poderoso Pidgeot e a Helix Fossil. Claro que tudo isso é apenas uma história elaborada pelos jogadores, mas vimos um exemplo prático de como a Anarquia continua levando a melhor.
Snorlax foi um momento cômico do time da Anarquia (Foto: Reprodução/Twitch)Snorlax foi um momento cômico do time da Anarquia (Foto: Reprodução/ Twitch)
No começo do oitavo dia de Pokémon Red, depois de idas e vindas em Lavender Town, os jogadores conseguem a Poke Flute e acordam o Pokémon Snorlax. Muitos estavam esperando para capturar o bicho. Outros tinham medo de matá-lo ao tentar capturar. O que realmente aconteceu? Um Raticate morreu. Um Drowzee também caiu. O fantasma Gastly resistiu, mas alguém teve a ideia genial de fugir da luta. Dessa forma, as pessoas perderam o Pokémon.
Antes de fugir do Snorlax, o time Anarquia não deixou de fazer uma homenagem ao (inútil) Helix Fossil na luta (Foto: Reprodução/Twitch)Antes de fugir do Snorlax, o time Anarquia não deixou de fazer uma homenagem ao (inútil) Helix Fossil na luta (Foto: Reprodução/Twitch)
Também testemunhamos a evolução do Pokémon Oddish, que se tornou a planta Gloom. É muito bacana ver alguns monstrinhos evoluindo enquanto cerca de 90 mil pessoas jogam ou assistem o mesmo game.
No décimo dia de jogatina, dia 23 de fevereiro, o Pidgeot do grupo, que estava no nível 59, conseguiu bater e ajudar a capturar um Pokémon lendário Zapdos, do tipo elétrico/voador. A captura do monstro foi celebrada pelos jogadores presentes, com o uso da Master Ball. Mas ocorreram problemas.
No mesmo momento, jogaram fora o Gloom que tinham visto evoluir, o Farfetch “DUX”, o Raticate “DigRat”, três Venonats, três Nidorans, um Geodude, um Paras e um Exeggcute. Cinco insígnias dos ginásios do game tinham sido conquistadas até aquele momento.
Jogadores vêem um monstro evoluir em Twitch Plays Pokemon (Foto: Reprodução/Twitch)Jogadores vêem um monstro evoluir em Twitch Plays Pokemon (Foto: Reprodução/Twitch)
Há um documento no Google que fala sobre o progresso do game, Twitter e YouTube não-oficiais, além de uma lista de discussão no Reddit. Para quem não quer jogar, mas quer ficar por dentro do assunto, os links são bastante indicados.
Os brasileiros no Twitch Plays Pokémon
Giancarlo Soares Ferreira (23) jogou cinco horas de TPP. “Foram duas horas na segunda-feira do dia 17 de fevereiro, entre duas da madrugada até às quatro. Depois, na terça-feira, joguei mais três horas, entre uma da manhã e três da madrugada. Achei muito bacana a brincadeira entre o time Anarquia e o Democracia”, explicou o gamer. Ele joga videogames desde os cinco anos de idade, quando ganhou um Nintendinho. “Meu jogo favorito é The Legend of Zelda. Incluo também todos da série Pokémon e Tetris Attack, todos são do Game Boy”, completa.
Um dos maiores problemas de Twitch Plays Pokémon é a quantia de pessoas jogando. Como são muitos comandos por segundo, é grande a chance de você tentar jogar e o comando não aparecer na tela principal. Você não tem ideia, sequer, se os seus comandos fazem alguma diferença no final das contas.
Mas um brasileiro conseguiu. Brunno Leonardo de Jesus Silva (24) conseguiu executar um comando de texto e ver sua ação na tela de TPP. “Achei super legal a divisão entre dois grupos políticos, como Anarquia e Democracia, dentro de um único jogo. Mas tem horas que dá raiva porque tem muita gente que ta lá só pra atrapalhar. E finalmente meu Pokémon favorito, que é o Pidgeot, está em algum lugar. Viva a Anarquia!”, comemora o jogador, que começou aos cinco anos, além de ser fã de games de dança como Pump It Up e DJ Max. Todas as mensagens mencionando o Helix Fossil fizeram Brunno dar boas risadas.
Brunno Leonardo de Jesus Silva conseguiu aparecer na tela de jogo de Twitch Plays Pokémon (Foto: Reprodução/@brunnoleonardo/Twitter)Brunno Leonardo conseguiu aparecer na tela de jogo de Twitch Plays Pokémon (Foto: Reprodução/ Twitter)












“As vontades de todos são feitas na Anarquia do jogo, e assim é formado um caos absurdo. Por meio de tentativa e erro, seus comandos podem dar certo, podem não ter efeito algum ou podem falhar miseravelmente. Teve gente que liberou Pokémons e itens importantes. Na Democracia, as coisas são mais demoradas mesmo que sejam permitidos combos neste regime, mas a opção mais votada em 20 segundos é sempre a que prevalece mesmo não sendo a maioria absoluta”, explica Thiago Péres Gomes (26), um dos brasileiros que chegou a fazer uma análise política do game. Para ele, Twich Plays Pokémon é uma ótima experiência para ver o comportamento das pessoas.
Thiago Péres Gomes jogou várias horas e enxerga comportamentos fortes nos gamers de TPP (Foto: Arquivo Pessoal)Thiago Péres Gomes jogou várias horas e enxerga comportamentos fortes nos gamers de TPP (Foto: Arquivo Pessoal)
Thiago ficou 15 horas em Twitch Plays Pokémon. “Mas só cheguei a jogar por cerca de duas horas seguidas, rindo muito durante todo o processo por causa das falhas que aconteciam”, explica. Ele abre o streaming e deixa rodando o game, prestando atenção nos sons para “ouvir o que acontece”. Seu envolvimento com Pokémon Red é antigo. “Meus jogos favoritos são Chrono Trigger e os das franquiasThe Legend of ZeldaPokémon e Final Fantasy. Joguei Pokémon em emulador por indicação de um grande amigo de infância meu. Desde então, virei consumidor: Comprei desde o jogo original para o meu Gameboy Classic até um Gameboy Color, que tenho até hoje, para jogar as versões que vieram depois”, completa.
Twitch Plays Pokémon teve mais audiência do que League of Legends, Minecraft e Dota 2, sobrecarregando o sistema de streaming (Foto: Reprodução/Twitch)Twitch Plays Pokémon teve mais audiência do que League of Legends, Minecraft e Dota 2, sobrecarregando o sistema de streaming (Foto: Reprodução/Twitch)
Como jogar um game que é acessado simultaneamente por 100 mil pessoas ao mesmo tempo com o mesmo personagem? Thiago Péres Gomes dá a dica: “Quando eu jogo, existem duas coisas indispensáveis para fazer, que é ter paciência e usar um script repetindo ANARCHY no chat”.
Os memes em Twitch Plays Pokémon
O pokémon Pidgeot virou uma espécie de deus no jogo coletivo. Seu nome é traduzido frequentemente como Jesus Bird (Foto: Reprodução/Twitch)O pokémon Pidgeot virou uma espécie de "deus" no jogo coletivo. Seu nome é traduzido frequentemente como "Jesus Bird" (Foto: Reprodução/Twitch)
“Sou pesquisadora do tema multimídia interativa como fenômeno expressivo e socializador. Terminei recentemente um mestrado sobre isso na Unicamp e estou montando um projeto de doutorado específico sobre games. Não pude deixar de acompanhar, é quase um ‘laboratório’ da minha pesquisa”, explica Beatriz Blanco (26), acadêmica, infografista e blogueira. Em entrevista à coluna Geração Gamer, ela realça o papel de união que as expressões e as piadinhas sobre o jogo provocam. “Os memes são uma das coisas mais legais de qualquer atividade hoje na internet. Geram um sentido de comunidade. Eles acabam sendo uma referência em comum de todos que estavam jogando, e movimentam a integração de quem vê a ‘piada interna’ compartilhada por aí, além de motivarem a criatividade do pessoal que faz as montagens”, diz.
Lucas Gellerth Famelli (23), que começou nos videogames aos quatro anos de idade, explica que no começo não gostou da divisão entre os grupos. “Eu achei que essa divisão meio política iria quebrar um pouco do caos. Mas depois notei que foi justamente o contrário. Muitas pessoas executavam os comandos "up up a a a b b", além de gritar DEMOCRACY e ANARCHY, uma bagunça. Claro que, quando a barrinha de Democracia está alta, o jogo avança bem mais. Mas dura pouco. Parece que a maior parte dos jogadores está lá pra causar confusão mesmo”. Para ele, boa parte da repercussão dos memes se deu pelas “brigas políticas” do jogo coletivo, entre quem queria fazer o que quisesse e os que queriam decidir os movimentos por consenso. “Acompanhar a confusão foi genial”, completa.
Indo na mesma linha, o brasileiro Lucas Gilberto Kern (22) realça que os movimentos anônimos de muita gente naquele jogo contribuiu para a criação de momentos marcantes. “Decisões simples, quando tomadas por um indivíduo, se tornaram quase que uma religião quando tomadas pelo grupo, ou por parte dele, como foi a criação da frase ‘Hail the Helix Fossil’. Existe também um exagero de sentido atribuído às ações tomadas pelo grupo. O Pokémon Drowzee, The Keeper, ficou depositado com o Flareon, conhecido como False Prophet, para enfraquecer ele e para que pudéssemos impedir o release no Flareon. Essa história que é criada em torno do stream que a torna tão interessante”, conta ele, entusiasmado.
A namorada de Lucas Kern, Francis Trombini Molina (24), diz que estão sendo criados streamings similares a Twitch Plays Pokémon, com um sistema de funcionamento diferente. “Um dos streams similares que foi lançado depois do principal, Twitch Plays Pokémon Blue, instaurou um sistema de Democracia logo no começo, chegando ao ponto dos administradores da página banirem pessoas que estavam colocando inputs que não contribuíram em nada para o jogo. Apesar de ter dado certo dentro do game, o processo foi bem menos interessante de acompanhar porque, como era coordenado, menos pessoas se interessaram”, diz ela.
O que se pode concluir, com os diversos depoimentos coletados com jogadores, é que a jogabilidade coletiva não é legal apenas pelo game, mas pela experiência e pelas histórias bizarras geradas no desenrolar dos fatos. Essas entrevistas acabaram realçando a ideia que foi divulgada pelo criador anônimo do TPP na página do jogo: “Ele foi criado como um teste para a viabilidade deste formato, na forma como as pessoas interagem colocando comandos no game e interagindo entre si socialmente”.
As pessoas estão jogando Tetris também?
No dia 18 de fevereiro, uma reportagem da jornalista Patricia Hernandez, do site Kotaku, encontrou uma outra sala de streaming do jogo Tetris simulando, com as peças, o mesmo movimento do personagem de Twitch Plays Pokémon. Qual é o propósito disso? De programar dois jogos com os comandos de milhares de jogadores? Como os criadores dessas salas são anônimos (até o momento), ninguém tem ideia. O nome da página acabou virando Twitch Plays Pokémon Plays Tetris.
100 mil pessoas estão jogando Pokémon Red e Tetris ao vivo e online? (Foto: Reprodução/Twitch)100 mil pessoas estão jogando Pokémon Red e Tetris ao vivo e online? (Foto: Reprodução/Twitch)
via Tech Tudo.
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