segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Empresas rejeitam quem troca muito de emprego


Eles já foram colocados em um pedestal por serem considerados ágeis, criativos e engajados. Também já foram chamados de superficiais, impacientes, arrogantes e inseguros. A sua necessidade de querer construir uma carreira de sucesso em pouco tempo em muitas empresas até já foi elogiada. Mas, agora, companhias e recrutadores resolveram fechar o cerco à chamada geração Y, formada por profissionais nascidos a partir dos anos 1980.
Apesar de ainda não terem alcançado o chamado C-level, os cargos executivos mais altos das grandes corporações – com exceção daqueles que empreenderam em suas startups -, esse é o caminho natural de parte deles. A preocupação, de acordo com especialistas, é que esses jovens acumulam muitas passagens no currículo, mas com pouco tempo de casa em cada uma. O resultado é falta de preparo na hora de ocupar cargos mais seniores.
Essa é uma das explicações para a quantidade de candidatos rejeitados ser proporcionalmente igual à dos selecionados para cargos de média e alta gerência pela Randstad Professionals. “Não é raro o cliente colocar isso como obstáculo, por isso costumo barrar alguns profissionais com esse perfil”, afirma Aron Conchester, que comanda a Randstad em Campinas (SP).
A declaração confirma um levantamento divulgado recentemente por outra consultoria em recursos humanos, a Robert Half. Foram entrevistados 1185 executivos de nove países. Pouco mais da metade dos cem brasileiros consideram muito provável a rejeição de candidatos com muitas passagens curtas. Segundo a pesquisa, cinco trocas de emprego em dez anos já é o suficiente para taxar um candidato de instável, na opinião de 20% dos entrevistados.
Na ânsia de crescerem rápido, esses profissionais que pulam de trabalho com uma certa frequência, geralmente com menos de dois anos, deixam de ganhar a experiência de enfrentar situações difíceis, de saber como agregar uma equipe e administrar conflitos. “Quando isso acontece, eles desistem por falta de consistência e partem para outro lugar”, diz o consultor Paulo Alvarenga, sócio da Crescimentum, consultoria especializada no desenvolvimento de líderes.
Administrar esse tempo virou uma equação difícil de resolver dos dois lados, principalmente quando não se consegue gerenciar a paciência para chegar ao topo e se coloca em jogo a própria reputação perante o mercado. Tanto os jovens como os gestores não sabem lidar com essa situação. “Os estudos falam das diferenças, mas não como tratar esse processo”, diz Peter Noronha, diretor regional da Asap Recruiters. “Na maior parte, essa é uma geração que tem um grau de lealdade menor com o empregador que a anterior. Eles querem reconhecimento a curto prazo e estão sempre olhando para fora”, diz Noronha. Por outro lado, ele ressalta que as empresas também não são mais tão leais como antes.
Por não saber gerenciar essas expectativas, muitas companhias acabam perdendo talentos que poderiam ser potenciais executivos. “O que atrai muito o jovem é a líder e não apenas o nome da instituição. Esse é o caminho”, afirma Alvarenga.
Há também casos de profissionais com início de carreira sólido, que chegam a ficar de cinco a dez anos dentro de uma mesma companhia, mas depois que saem acabam não se adaptando tão rapidamente a outras. É o caso de Arthur Favoretto, de 33 anos.
Fugindo dos padrões da sua geração, ele passou oito anos na multinacional em que havia entrado como estagiário e saiu quando não viu mais chances de se desenvolver. Em apenas um ano e meio, trabalhou em duas empresas. “Não consegui me adaptar à cultura”, conta. Há quatro anos está em outra multinacional, a sueca Atlas Copco, onde é coordenador de vendas. “Assim como eu, a maioria dos meus amigos preferem ficar se forem oferecidas oportunidades de crescimento e desafios”, diz Favoretto. Atualmente, ele está participando de processos internos para outra divisão da empresa.
Sua antítese é a advogada Fernanda Medeiros, de 32 anos, que em seis anos está no quinto emprego, sem contar os dois estágios. O mais duradouro foi pouco mais de três anos. Após se formar, entrou para um MBA de administração de empresas, fez uma pós-graduação em negócios imobiliários e emendou com um mestrado de direito concorrencial. Há nove meses trabalha como especialista em fundos de investimentos do Citibank. “Tenho ambição de crescer rápido, mas o que procuro é estar em um lugar onde eu possa ter oportunidade de liderança”, diz Fernanda.
De modo geral, os especialistas concordam que dois anos é um período minimamente aceitável dentro de uma companhia para integrar projetos, entregar resultados e participar de transformações. Claro que há exceções, mas vai ser preciso ter uma explicação convincente. Do contrário, as chances de ser barrado crescem ainda mais, principalmente se o motivo for apenas financeiro.
O tempo também muda conforme o cargo e o nível da posição. “Permanecer por cinco anos como analista júnior e ficar cinco anos em uma diretoria têm significados diferentes. Uma função executiva envolve conhecimentos, relacionamentos, habilidades de gestão e maturidade, o que requer mais tempo”, diz Roberta Giuliano, sócia na Passarelli Executive Search.
Muitas vezes, a mensagem que se passa para o mercado por quem foge a essa regra é instabilidade, rigidez, falta de liderança ou dificuldade de relacionamento. O que se precisa, segundo Roberta, é entender quais os reais motivos que fizeram esses profissionais ficarem pouco tempo em uma empresa ou em um cargo. “A companhia pode ter sido vendida ou o contrato era para um projeto específico”, exemplifica.
Questões desse tipo sempre foram barreiras nos processos de seleção que Andreia Bolzan, de 37 anos, participou. Mesmo não sendo uma Y, ela passou por quatro empregadores nos últimos dez anos. Como se não bastasse, sempre mudou também de segmento. Mas, nem por isso, se sentiu prejudicada. “Vejo isso como uma vantagem, o mercado é que ainda não está preparado”, diz. Atualmente, Andreia é gerente corporativa de RH do grupo capixaba Cedisa, onde está há apenas três meses – e pretende ficar.
Na sua opinião, passar por instituições sem agregar valor para a sua carreira é o grande problema. “Mesmo em curtos períodos, sempre busquei absorver e entregar o máximo possível.” Ela reconhece, entretanto, que se estivesse em um mercado maior, como São Paulo ou Rio, talvez tivesse enfrentado dificuldades por ter uma concorrência maior. Como gestora, tenta não levar esse tema em consideração nos processos em que ela é a contratante. “Só não posso esquecer que estou dentro de um sistema e um mercado conservador.”
O caso de Andreia ilustra uma mítica generalizada em torno de algumas características imputadas com exclusividade à geração Y, como a busca por desafios e a capacidade de mudar de emprego. Para alguns especialistas, essas necessidades são apenas um reflexo da realidade econômica da nossa época. “A entrada desses jovens no mercado coincidiu com a fase de crescimento da economia brasileira e a escassez de mão de obra especializada. As oportunidades estavam em toda esquina. Foi como juntar o fogo e a pólvora”, diz Marcelo Ferrari, diretor da consultoria em recursos humanos Mercer.
Novamente, é a própria conjuntura econômica atual do país que começa a modificar esse quadro. Uma recente pesquisa da Mercer constatou que o valor médio estimado de “turnover” entre os profissionais Y nas grandes corporações caiu de 19% em 2010 para 14% em 2014. Ou seja, os jovens estão ficando mais tempo em um lugar. Grande parte dessa redução, no entanto, também se deve aos programas de entrada focados em processos de estágio e trainee, que passaram a ser adotados com maior ênfase nos últimos anos pelas grandes empresas. “Os investimentos nesses programas estruturais, quando são bem feitos, resolvem boa parte dos problemas. A questão é que só a minoria faz”, diz Ferrari.
No entanto, vale ressaltar que nem sempre muito tempo em um lugar significa engajamento, sucesso ou talento. “Recentemente um cliente disse que uma candidata para uma alta posição executiva, embora muito qualificada, não servia. Isso porque ela estava há 12 anos na mesma empresa e talvez não se adaptasse ao novo desafio”, conta Manoel Rebello, da empresa de recrutamento de executivos Heidrick & Struggles.
O exemplo não diminui o mérito da preocupação das companhias em relação à permanência dos jovens profissionais. Apenas ressalta que as necessidades delas também mudam de acordo com o segmento, a cultura e o momento em que vivem. Para Rebello, a capacidade de ser flexível ao lidar com pessoas de diferentes experiências será o desafio para a busca do equilíbrio entre oferta e procura no mercado nos próximos anos. “Quando os mais veteranos começarem a se aposentar em massa e a próxima geração – a chamada Z – entrar no mercado de trabalho, haverá um ‘gap’ ainda maior.”
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