Casos Zoe Quinn, Phil Fish e Anita Sarkeesian revelam uma comunidade gamer mais difícil?
Uma nova polémica eclodiu esta semana na indústria dos videojogos. Denominada #gamergate, é mais uma troca de argumentos que envolve produtores de jogos, jornalistas e jogadores. À semelhança de outras controvérsias que resultaram em pouco, é bem provável que daqui por umas semanas o assunto haja um regresso à normalidade, mas talvez menos normal. A diferença é que desta vez parece ser mais evidente a crispação entre jornalistas, produtores e jogadores, com os primeiros a tecerem diversas críticas aos comportamentos agressivos e nalguns casos violentos dos jogadores, ao ponto de admitirem que a definição clássica de um "gamer" está ultrapassada e com os últimos a colocarem em causa a imparcialidade e independência de sites e publicações relacionadas com os videojogos.
Dois rastilhos estão na base do fogo. Primeiro, o "escândalo" Zoe Quinn. Zoe é uma produtora de jogos indie, norte-americana, criadora do jogo Depression Quest e que tem ocupado o centro da polémica devido ao presuntivo favorecimento de algumas análises relativas ao seu jogo na sequência de relacionamentos amorosos mantidos com um jornalista e com um membro de um júri de um evento dedicado aos jogos independentes. Este efeito de projecção e benefício da sua carreira, terá sido motivado por Nathan Grayson (que publicou uma análise positiva do Depression Quest no Rock, Paper e Shotgun e outra no Kotaku) e por Robin Arnott, por ocupar um lugar relevante num evento de jogos independentes, onde constava o jogo de Zoe. Na esfera dos jogadores isto foi o suficiente para revelar como continuam a persistir favorecimentos em torno de certos produtores e editoras, especialmente na produção indie, num tempo de produção acessível. Empolando os efeitos da agitação, rapidamente se chegou ao ponto de alegar a falência de princípios como isenção e independência dentro de publicações respeitadas.
Para agravar ainda mais a situação, a crítica de videojogos Anita Sarkeesian lançou mais um vídeo da sua série Tropes Vs Women, no qual descreve a representação da mulher nos videojogos. Foi o suficiente para juntar mais uma onda violenta de reacções. Não apenas verbalmente mas também com ameaças que puseram em causa a segurança da autora do vídeo, ao ponto de ter que mudar de residência para evitar algo pior. Em resposta às reacções violentas de jogadores ao vídeo publicado por Anita e na sequência do escândalo Zoe, alguns jornalistas, alegando em defesa dos produtores de videojogos e da sua integridade publicaram artigos repugnando o "cyber bulling" e comportamentos sexistas por parte dos "gamers", chegando ao ponto de argumentar que a figura jogador como conhecíamos não existe mais.
Este é o ponto da situação, com um confronto mais evidente entre jornalistas e a comunidade de jogadores, motivado pelas reacções exageradas e violentas destes para com os produtores da indústria. Esta série de episódios culminou esta semana na publicação de uma carta aberta escrita pelo produtor indie Andreas Zecher e subscrita por centenas de produtores de videojogos, dirigida à comunidade de jogadores. E nesta sequência de "episódios" não é menos relevante o "caso" Phill Fish, também envolvido em argumentos violentos de jogadores em resposta a pequenos textos seus no "twitter" pouco abonatórios para a comunidade "gamer", como o não merecimento da sequela de Fez.
Os casos de Zoe Quinn e Phil Fish, apesar de partirem de motivações distintas, representam uma tentativa de quase controlo das suas produções por parte de segmentos da comunidade mais fervorosos. A polémica em torno do suposto favorecimento do jogo de Zoe Quinn é o caso mais flagrante. Desde logo porque é um assunto de natureza particular e nem sequer existe prova bastante da suspeita em como a carreira de Zoe foi efectivamente beneficiada através da relação amorosa que manteve com um jornalista e com um membro de um júri. Não resulta claro que o benefício e avaliação positiva do seu jogo não deixaria de ser atribuído por outros elementos. Além disso, como qualquer assunto que gera polémica, a tendência para a generalização e um pôr em causa a independência e ética de demais jornalistas deflagram e alastram como lume sobre palha seca.
Num tempo de fácil acesso a ferramentas destinadas a produzir jogos para smartphones, tablets, computadores e consolas, antevê-se que ligações dos criadores de jogos a publicações possam beneficiar de um encaminhamento mais rápido dos seus jogos, ganhando eco e cobertura, não se podendo confundir no entanto parcialidade com disponibilidade de informação e cobertura. É o risco destas polémicas, quase sempre exageradas, difusas e sem um fio condutor, partindo de casos isolados e pessoais para os dar como transversais, num tempo de grande aproximação entre os media e comunidade "gamer".
Pese embora a suspeita de violação dos princípios de independência e ética, o que esta polémica revela é uma tentativa de coacção e limitação à liberdade de expressão e opinião. As polémicas em torno de Zoe Quinn, Phil Fish e Anita Sarkeesian partem de contornos distintos mas em qualquer uma as intromissões dos jogadores são abusivas, pouco racionais e pouco motivadas, revelando quase ou nenhuma disposição para perceber a cultura dos videojogos. Se a comunidade gamer clama por mais independência e ética não pode fugir das mesmas regras. Afinal, os videojogos também são um passatempo.
Fonte: EuroGamer.
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